Arc. Alexis servindo a Sagrada Liturgia Paróquia da Dormição da Mãe de Deus - Recife |
Nesta terceira
parte da entrevista com o Arcipreste Alexis, algumas questões parecerão
interessantes aos sedentos em espiritualidade ortodoxa, principal e
especialmente o relato de sua estadia na Santa Montanha do Athos.
Contamos também com algumas informações sobre a ação missionária da
Igreja Ortodoxa Sérvia na América Latina.
Confira também a parte 1 & a parte 2 da Entrevista.
Confira também a parte 1 & a parte 2 da Entrevista.
AuroraOrtodoxia: Ficamos
sabendo que o senhor teve a grande benção de conhecer o “Jardim da Mãe de Deus”
– a Santa Montanha do Athos. Por favor, conte-nos um pouco desta experiência.
Arcipreste Alexis: Sobre
o Monte Athos, a verdade é que nunca imaginei que pudesse um dia conhecer a
Santa Montanha. Mas aconteceu de uma forma inesperada. Morei um ano na Espanha
quando escolhi a cidade de Barcelona para fazer um ano de Doutorado em
Linguística, em virtude da Igreja Ortodoxa Sérvia ter uma excelente paróquia
nesta cidade, no período de 2003 a setembro de 2004.
Neste período também visitei o
Monastério de Godoncourt na França onde residem um grupo de monjas brasileiras
e algumas delas foram minhas fiéis em Aldeia, Recife. Por ocasião da Páscoa
decidi visitá-las e celebrar com elas a Grande Festa. Conheci um Padre francês
que era o Capelão deste Monastério, e ele me incentivou a visitar Monte Athos.
Falou que tinha um irmão no Sagrado Monastério de Vatopedi e era fácil
conseguir com ele um convite e a entrada na Santa Montanha.
MONTE ATHOS Jardim da Toda-Santa Deípara |
Voltando a Barcelona aguardei o
contato deste Padre francês que nunca chegou. Mas na Paróquia Sérvia de
Barcelona havia um fiel grego (Christos) que visitava a Santa Montanha. Foi ele
quem conseguiu o apoio necessário para realizar a visita em julho de 2004.
Antes passei por Belgrado, pela Sérvia, e conheci a Catedral de São Savas,
assistindo também ao Patriarca Pavle, num sábado em que celebrava em sua
residência. No final, recebi sua benção patriarcal. Nesta visita a Sérvia pude
venerar as relíquias de São Nikolai Velimirovitch e São Justin Popovitch, como
também visitar vários monastérios.
A seguinte escala foi Tessalônica
onde pude venerar as Santas relíquias de São Gregório Palamas e várias igrejas nesta
cidade evangelizada pelo Apóstolo São Paulo. Ai recebi um documento que
autoriza o ponto de embarque ao Monte Athos em Ouranópolis [Diamonitirion]. A
viagem de Tessalônica até Ouranópolis feita de ônibus dura três horas.
Em Ouranópolis seguimos de barco
para Monte Athos. A emoção é muito grande, a beleza do mar e a vista da Santa
Montanha é indescritível... por tudo que representa e tudo que sabemos dela.
Depois do Santo Sepulcro é o lugar mais santo para a Ortodoxia, o Jardim da
Virgem.
Primeira visita ao Monte Athos 2004 |
Monte Athos [os gregos a chamam
de Agiós Orós, Santa Montanha] é uma península à qual somente se chega por
navio e abriga vinte monastérios, doze Skitis, pequenos monastérios e mais de
250 kélias, pequenas comunidades de monges hesicastas que praticam o silêncio. O
Monte Athos faz parte da península de Calcídica na Grécia, e tem uma extensão
de 335 quilômetros quadrados cuja capital administrativa é Kayres.
Declarada Patrimônio da
Humanidade pela Unesco, faz parte da República da Grécia, sendo um Estado
Monástico Autônomo com governo próprio, um Conselho escolhido pelos
representantes dos Monastérios e sob a jurisdição do Patriarcado Ecumênico de
Constantinopla.
Aparecem os primeiros Monastérios:
Docheiariou, Xenofontes, São Panteleimon, monastério russo, o imponente Simonos
Petras e finalmente chego ao São Gregoriou onde passei toda minha estadia de
seis dias. Optei por me concentrar na oração. Os monges estranharam o fato de
ter ficado somente neste monastério, pois geralmente os visitantes são sempre
peregrinos desejosos em conhecer o maior número de monastérios possível, o que é
natural dada a riqueza que cada um deles tem a oferecer em termos de ícones,
capelas e relíquias.
Monastério Docheiariou |
Monastério Xenofonte |
Monastério São Panteleimon |
Em São Gregoriou, fui às Vésperas
e fiz a segunda refeição do dia [somente duas refeições por dia, as 9h depois
da Liturgia e as 19h depois das Vésperas]. Pude comungar e fui recebido pelo
Abade Georgios, que me deu a benção para traduzir sua obra Theosis para o português e publicá-la como livro, me deu também um
belo livro de fotografias do Monastério e muitos ícones em estampa para os fiéis.
Mas a estadia em São Gregoriou
foi abençoada, obtive graças pessoais e fui convidado a celebrar no dia 10 de
julho a primeira liturgia no Monte Athos. Ao todo, celebrei três Liturgias cantando as ecfonéses
em grego, espanhol, português e catalão.
Sai muito triste de lá deixando
vários amigos e com a esperança de voltar um dia confiando em Deus poder
realizar este sonho e reencontrar este santo lugar.
Monastério Grigoriou |
A segunda visita, o sonhado retorno
a Santa Montanha ocorreu ao final de julho de 2013 e desta vez reencontrei o São
Gregoriou e o meu amigo o monge Damianos, um grego nascido em Londres.
conversamos longamente, por cinco horas seguidas, atualizando estes mais de
nove anos de intervalo. Reencontrei o Abade Georgios bastante doente e ofereci-lhe
o livro Theosis que prometera
publicar em português na visita passada.
Desta vez pude visitar o monastério
vizinho, Simonos Petras, subindo a pé quase uma hora. Chegando por lá fui recebido
pelo Hieromonge Makarios, francês. Por sinal o Monastério de Solan (em Avignon,
na França), onde temos a Irma Iosifia, monja brasileira, que batizei em Recife,
e cujo Pai Espiritual e Fundador é o renomado e mui meu amigo, o Arquimandrita
Placide Deseille é um Metóquion (dependência) de Simonos Petras.
Monastério Simonos Petras |
Logo depois pude visitar o
Sagrado Monastério sérvio de Hilandar que no ano 2004 não pude conhecer por
causa do incêndio ocorrido em março daquele ano, interditando as visitas.
Conhecer este santo lugar foi uma benção muito grande, pois foi fundado por São
Savas no século XIII. Este é um dos lugares mais inspiradores da
espiritualidade e santidade do povo sérvio e ortodoxo em geral. Dou graças a
Deus por tudo isto.
AuroraOrtodoxia: Como se
desenvolvem as missões sérvias da América Latina?
Arcipreste Alexis: Sobre
as missões ortodoxas sérvias na América Latina devemos lembrar que apenas três
anos atrás foi criada a Diocese de Buenos Aires e das Américas do Sul e
Central. Por outro lado, temos que reconhecer a divida histórica da Ortodoxia
para com os povos latino americanos, na medida em que, muito pouco foi feito em
prol do trabalho missionário.
Sabemos que desde o início da
migração de comunidades ortodoxas, no final do séc. XIX e inicio do séc. XX,
estas populações com a árdua tarefa de sobrevivência e adaptação a realidade
local tiveram como tarefa principal a manutenção da fé e por isto eram bastante
fechadas para o público local. Fora isto, as línguas usadas eram basicamente as
línguas de origem.
Como resultado, poucas pessoas
locais conseguiram tornar-se membros da Igreja Ortodoxa, quanto não, muitos
ortodoxos por falta da presença da Igreja nestes territórios integraram-se
principalmente à Igreja Católico-Romana.
Do ponto de vista do propósito de
criação desta nova diocese e por reiteradas declarações do nosso Metropolita
Amfilohije, existe o reconhecimento desta deficiência histórica e também o
interesse em realizar um trabalho missionário na América Latina.
Sagrada Liturgia em Aldeia Segunda visita pastoral do Metropolita Amfilohije a Recife - set. 2012 |
A melhor prova disto foram sem
dúvida as visitas pastorais que nosso Metropolita vem realizando a este
continente há três anos. Com isto temos o seguinte quadro:
- Argentina: Consolidação
das comunidades e
paróquias sérvias, por isto é a sede da Diocese, com paróquias em Buenos
Aires: Catedral da Natividade da Mãe de Deus e São Savas da Sérvia; na
província de Chaco,
Paróquia San Nicolás; em General Madariaga - Província de Buenos Aires -
Paróquia São Pedro de Tsetinhe; em La Plata paróquia de San Jorge.
Catedral da Natividade da Mãe de Deus Celebração com Hierarcas russos (D. Platão e D. João) e grego (D. Tarásios) Buenos Aires - 2011 |
Igreja de San Nicolas - Chaco |
- Brasil: Paróquias em Pernambuco, em
Recife, Paróquia da Dormição da Mãe de Deus; em Caruaru, Paróquia de São João
Crisóstomo; em Belo Jardim, Paróquia de Santo Antônio o Grande; aos cuidados de
Pe. Jairo; Monastério da Santíssima Trindade em Aldeia - Camaragibe com o
Higumeno Pedro e Pe. Elias. No estado de São Paulo, cidade de
Campinas, Paróquia Missionária São Pedro e São Paulo, com Padre Marko
Obradovitch.
Metropolita Amfilohije na Paróquia da Dormição da Mãe de Deus Recife - 2011 |
- Venezuela: Caracas, Paróquia San Jorge; em
Maracay, Paróquia de San Juan Bautista. [sem sacerdote].
- Chile, em Santiago Paróquia de
San Nikolai de Jitcha, com Padre Dushan Mihailovitch.
- Equador: em Guayaquil Paróquia
de la Anunciación de La Madre de Dios. [responsável Jacobo Touma].
Equador - Guayaquil |
- Peru: Missão em Lima.
- República Dominicana: Missão em
Bavaro.
-Colômbia: Medellín: Paróquia de la
Santísima Trinidad [Hieromonge Simeón, colombiano]
Hieromonge Simeon no Monastério de Ostrog Montenegro 2014 |
Tonsura Monástica do Padre Simeon Monastério de Tsetinhe - Montenegro 2014 |
-El Salvador [América Central]:
Missão em San Salvador e Sonsonate. [Responsável: Hector Rodriguez,
salvadorenho].
El Salvador 2013 |
El Salvador 2014 |
El Salvador 2014 |
O trabalho nestes lugares carece
ainda de sacerdotes e estrutura financeira que são duas das tarefas principais
que a Diocese esta cuidando no momento para sanar. Considero que o mais
importante passo foi dado, a criação da Diocese [espera a eleição do Bispo
local], a definição do objetivo de fazer missão nestas terras, agora trabalhar
e orar para fazer a vontade de Deus.
AuroraOrtodoxia: A partir
desta experiência, como o senhor concebe a Ortodoxia na América Latina e no
Brasil?
Arcipreste Alexis: A
Ortodoxia na América Latina, no meu modo de entender poderá desenvolver-se
dentro de um cenário bastante desfavorável. Existe uma polarização cada vez
maior entre o catolicismo romano, que a cada dia perde terreno, e o
protestantismo, principalmente o pentecostalismo, bastante ativo nestes países.
O protestantismo pentecostal com
a sua fragmentação e pulverização da infinidade de denominações criou uma
oferta muito grande de “igrejas” o que confunde o público.
Por outro lado, a Ortodoxia é
muito desconhecida e por isto desperta interesse em alguns grupos que de uma
forma sincera buscam conhecer melhor a história da Igreja e gostam de estudar
as características da Igreja primitiva ou demonstram interesse pela Liturgia ou
mesmo pelos ícones e a musica litúrgica. Estes são uma minoria que sente
necessidade de uma espiritualidade mais profunda e menos superficial e buscam,
sobretudo, uma teologia e doutrina menos flutuante e sujeita a tantas inovações
que deformam a identidade religiosa.
Na prática, estes cristãos na sua
grande maioria não demonstram nem mesmo curiosidade pelo Cristianismo Oriental
e consideram as Liturgias longas, cansativas e não lhes apetecem as quaresmas
com seus dias de jejum.
Os apelos dos cultos pentecostais
e as inovações católicas criaram grandes contingentes de fieis avessos a um
culto teocêntrico, sem apelos emocionais e a busca de recompensas matérias,
sociais e emocionais torna a Ortodoxia pouco atraente.
Portanto, considero que a adesão à
Ortodoxia será sempre pequena e minoritária o que por outro lado, da nossa
parte exige um esforço muito grande para fazer a Ortodoxia mais conhecida onde
cabe um trabalho missionário mais eficiente e organizado. Neste ponto temos que
reconhecer que temos feito menos do que devíamos e podíamos fazer.
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