sexta-feira, 12 de setembro de 2014

SOBRE O JEJUM CRISTÃO


Em tudo o que se refira à prática do jejum e da abstinência devemos sempre nos conformar às regras estabelecidas pela Santa Igreja Católica Apostólica Ortodoxa, recebendo d´Ela, como de uma Mãe e Mestra, as normas e orientações para uma santa e equilibrada prática do jejum.
Aos que procuram viver como verdadeiros discípulos de Nosso Senhor, Deus e Salvador Jesus Cristo, é sumamente necessário que disciplinem seus corpos, assim como seus espíritos. Seja o jejum praticado na sobriedade em nutrir o corpo, concedendo-lhe o justo e necessário alimento e negando-lhe todo o supérfluo, para que a carne não venha a se levantar contra o espírito e, obscurecendo as potências da alma, arruíne a vida espiritual.
O jejum é "algo indispensável para se adquirir os frutos do Espírito Santo em nossa vida" (São Serafim de Sarov)
O jejum é uma maneira de exprimir o amor a Deus e a generosidade em buscá-Lo. Através do jejum, sacrificam-se os prazeres terrenos para obter-se o verdadeiro gozo das coisas celestiais. Uma parte excessivamente grande de nossos pensamentos é abarcada pela preocupação com a subsistência (o que havemos de comer e o que havemos de vestir). Assim, o jejum se mostra como um instrumento de purificação da alma e do corpo, e um aliado indispensável na luta contra os desejos egoístas. Ao lado da oração, o jejum é uma das mais poderosas armas disponíveis ao homem para sua luta espiritual, tendo sido sempre recomendado, seja pelo próprio Nosso Senhor, Deus e Salvador Jesus Cristo, seja pelos Santos Padres da Igreja e pelos demais Santos e Santas de todos os tempos, lugares e condições, cujos ensinamentos e exemplos são dignos de toda veneração e acatamento.
"Pois se o desejo e a gula em questão de comida e bebida tomam preponderância, e as vontades próprias que os manobram o fazem insaciável, a tudo isto virá ajuntar-se, todavia, a atividade do diabo. Ao contrário, o Espírito se ocupa daqueles que buscam uma quantidade conforme a pureza, e mostra-lhes uma quantidade suficiente para sustentarem seus corpos, sem conhecer o atrativo da concupiscência. Então se realiza neles a palavra de São Paulo: “Quer comais, quer bebais, ou façais outra coisa, fazei tudo para glória de Deus' (I Cor. 10, 31)" (Santo Abade Antonio - o Grande)
"O jejum e a abstinência de certos alimentos é a oração do corpo, pois educamos nossa vontade corporal para se chegar à perfeição espiritual. O jejum refreia a tagarelice. Ele nos fará misericordiosos e dispostos a obedecer; destrói os pensamentos maus e elimina a insensibilidade do coração. O jejum é uma maneira de exprimir o amor e a generosidade; através dele, sacrificam-se os prazeres da terra, para obter as alegrias do céu". (Santo Abade João Clímaco)
São João Kolov dizia: "Quando um rei quer conquistar uma cidade, ele primeiro corta o suprimento dos alimentos. Daí, os cidadãos que sofrem de fome se submetem ao rei. A mesma coisa acontece com os nossos desejos: quando o homem leva uma vida austera, jejuando e até passando fome, as paixões morrem".
 "... pois a sensualidade expulsa do coração o espírito de penitência e o santo temor de Deus, assim como a fumaça afasta as abelhas, extingue a graça e priva a alma do conforto e da presença do Espírito Santo". (Santo Abade Poimén)
"Se você se jogar na comida ou bebida com voracidade, você será carne, e se você jejuar e orar você será espírito”. “Não vos embriagueis com vinho, que é uma fonte de devassidão, mas enchei-vos do Espírito” (Efésios 5,18). Jejue e ore, e você realizará grandes feitos. “O saciado não tem capacidade para realizações”. (São João de Kronstadt)
 "Devemos ingerir diariamente, alimentos suficientes para fortalecer o corpo, para que o mesmo estando fortificado seja amigo e auxiliar da alma na realização das virtudes; caso contrário poderá acontecer que, através do enfraquecimento do corpo, a alma também enfraqueça. Nas quartas e sextas-feiras, principalmente nos quatro períodos de jejum, seguindo o exemplo dos Padres, devemos nos alimentar apenas uma vez no dia, - e o Anjo do Senhor se afixará em você". (São Serafim de Sarov)
"Domina teu ventre e não permita que ele te domine, a fim de que não queira, logo que tenha sido envergonhado, guardar a abstinência que não guardaste no momento oportuno."  (Santo Abade João Clímaco).
"Jejuar é violentar a natureza, cercear os deleites do paladar, mortificar a carne, livrar-se das ilusões, purificar a oração, iluminar a alma, desterrar a cegueira; é a porta do arrependimento, humilde suspiro, alegre contrição, morte da loquacidade, portador da quietude, guardião da obediência, alívio durante o sono, pureza no trabalho, motivo de tranqüilidade, perdão dos pecados, porta de entrada dos deleites do Paraíso. Tudo isto é o jejum, porque ajuda em tudo a dispormo-nos para combater seu inimigo, a gula." (Santo Abade João Clímaco).

O JEJUM DA MENTE

O jejum da mente consiste na permanente vigilância interior (guarda do coração) e no constante combate contra as divagações dos pensamentos e as distrações inúteis da mente, os quais desviam a alma da contemplação de Deus, fixando-a nas criaturas, servindo ainda como portas de entrada  para as tentações e os pecados interiores.
"Não é suficiente abster-se das conversas inúteis e palavras ociosas, mas igualmente das ações inconvenientes e inúteis do corpo e da dissipação interior dos pensamentos e vãs cogitações do espírito. A alma se afasta das más divagações, guardando o coração, para impedir seus membros - os pensamentos - de divagarem pelo mundo". (Santo Abade Macário - o Grande)
"O espírito que não está disperso entre os objetos exteriores, nem espalhado pelo mundo por meio dos sentidos, volta a si mesmo e sobe por si próprio ao pensamento de Deus".  (São Padre Basílio – o Magno).
"Lembrai-vos, pois, de Deus, para que Ele se lembre incessantemente de vós; lembrando-se de vós, Ele vos salvará e vós recebereis todos os seus bens. Não O esqueçais em vãs distrações se não quiserdes que Ele vos esqueça na hora de vossas tentações". (Santo Isaac - o Sírio).
"Em três coisas se manifesta a vida do cristão: nas obras, na palavra e no pensamento. Dentre elas, o lugar principal é ocupado pelo pensamento, pois o pensamento é o princípio de toda palavra; em segundo lugar, após a reflexão, se segue a conversação, que revela através das palavras o pensamento concebido na alma; o terceiro lugar - em seguida ao pensamento e à conversação – ocupam as obras, que realiza o que foi pensado". (Santo Padre Gregório de Nissa)
"Coloquemos um freio na efervescência dos pensamentos que nos angustiam e que brotam do nosso coração, como uma água em ebulição, lendo as Escrituras e ruminando-as incessantemente... e nós ficaremos livres..."       (Santo Abade Pacômio).

O JEJUM DA LÍNGUA

O jejum da língua consiste no rígido controle do que se fala, evitando-se toda conversação vã e inútil, principalmente aquelas que podem ofender a Deus e ao próximo. Portanto, devem ser banidas de nossas bocas todas as conversas inúteis, que são aquelas que não se destinam a fomentar a boa convivência com o próximo ou a instruir, orientar e edificar as pessoas de nosso convívio, e com muito mais cuidado ainda, as ironias, as queixas, as murmurações, os comentários desnecessários sobre a vida do próximo, as difamações, os julgamentos e a vã curiosidade.
Tarefa muito difícil e que exige grandes esforços é dominar a própria língua, mas com a ajuda da Graça de Deus poderemos vencer esse tirânico inimigo. Tenhamos sempre presente em nossos corações, as palavras de Nosso Senhor, Deus e Salvador Jesus Cristo que declarou que até das palavras ociosas haveremos de prestar contas no Dia do Juízo!
"Filhos, vinde escutar-me, vou ensinar-vos o temor do Senhor. Qual é o homem que deseja a vida e quer longevidade para ver a felicidade? Preserva tua língua do mal e teus lábios de falarem falsamente". (Salmo 33: 12-14)
"Eu disse: Guardarei meu caminho para não pecar com a língua". (Salmo 39: 2)
 "Nas muitas palavras não falta o pecado, quem retém os lábios é prudente".
 (Provérbios 10: 19).
"Quem vigia a própria boca guarda a sua vida, mas se perde quem escancara os lábios". (Provérbios: 13, 3)
"A língua mentirosa odeia suas vítimas e a boca fluente provoca a ruína". (Provérbios 26: 28).
"O homem sábio calará até o momento oportuno". (Eclesiástico 20: 7)
"Quem fala muito se torna detestável". (Eclesiástico 20: 8)
"Um golpe de chicote deixa marca, mas um golpe de língua quebra os ossos. Muitos caíram pelo fio da espada, porém muito mais foram os que caíram por causa da língua". (Eclesiástico 28: 17-18)
"Eu vos digo que de toda palavra vã que os homens disserem, prestarão contas no Dia do Julgamento. Pois por tuas palavras serás justificado e por tuas palavras serás condenado". (Mateus 12: 36-37)
"Mas o que sai da boca procede do coração e é isto que torna o homem impuro". (Mateus 15: 18)
"Se alguém pensa ser religioso, mas não refreia a língua, antes se engana a si mesmo, saiba que sua religião é vã". (Tiago 1: 26)
"Aquele que não peca no falar é realmente homem perfeito, capaz de refrear todo o corpo". (Tiago 3: 2a)
"Ora, também a língua é fogo. Como o mundo do mal, a língua é posta entre os nossos membros maculando o corpo inteiro e pondo em chamas o ciclo da criação, inflamada como é pela geena". (Tiago 3: 6)
"Não saia dos vossos lábios nenhuma palavra inconveniente, mas, na hora oportuna, a que for boa para edificação, que comunique graça aos que a ouvirem". (Efésios 4: 29)
Na Tradição da Santa Igreja Católica Apostólica Ortodoxa, podemos encontrar diferentes formas de ascese, mas em todas elas é prescrita a observância do silêncio, como elemento indispensável ao recolhimento interior e exterior e manutenção do espírito de compunção. O Santo Abade Benedictus, enumerando os instrumentos das boas obras, prescreve aos monges em sua regra:
"Não gostar de falar muito (...) Não falar palavras vãs ou que só sirvam para provocar o riso (...) Não gostar do riso excessivo ou ruidoso". (Santo Abade Benedictus)
"Façamos o que diz o Profeta: ‘Eu disse, guardarei os meus caminhos para que não peque pela língua; pus uma guarda à minha boca; emudeci, humilhei-me e calei as coisas boas’. Aqui mostra o Profeta que, se às vezes, se devem calar mesmo as boas conversas, por causa do silêncio, quanto mais não deverão ser suprimidas as más palavras, por causa do castigo do pecado?". (Santo Abade Benedictus)
"Quando o coração está, pois, fortificado com o poder que recebe do Espírito, ele mesmo acaba purificado primeiro, santificado, corrigido, e as palavras que confia à língua estão isentas do desejo de agradar, assim como de toda vontade própria. Nele se cumpre o que disse Salomão: `Minhas palavras são de Deus, não há nelas dureza ou perversão' (Provérbios 8,8) e
'A língua do justo cura as feridas' (Provérbios 12, 18)" (Santo Abade Antonio - o Grande)

O JEJUM DOS OLHOS

O jejum dos olhos deve consistir em evitar-se toda vã curiosidade de ver coisas desnecessárias ao nosso progresso humano e espiritual.
No mundo tecnológico e globalizado no qual vivemos, imersos num oceano de informações, as quais nos envolvem e nos submergem, mobilizando nossas mentes, é preciso cuidadosa vigilância sobre nossos olhos, para que eles não se tornem portas de entrada para o pecado e se transformem em instrumentos de perdição. Neste sentido, o Cristão deve utilizar-se dos meios de comunicação disponíveis, como a internet, a televisão, a imprensa, e demais meios de comunicação de massa, sempre com temor de Deus, santamente, com olhos e coração castos.
Conforme nos adverte o Santo Padre João Chrisóstomo, todo Cristão fiel ao seu Batismo (no qual renunciou a Satanás, e a todas as suas obras, e a todas as suas pompas) deve evitar os espetáculos (teatros, circos, shows profanos e coisas do gênero), ao que, segundo o mesmo espírito, poderíamos hoje acrescentar os filmes perversos e anti-cristãos, as novelas da televisão e todos os programas transmitidos pela televisão que não tenham uma finalidade instrutiva ou informativa, como os programas de distração e variedades, os quais, comumente, divulgam idéias e costumes contrários ao Cristianismo, como a libertinagem, a sensualidade, a pornografia, a cobiça, a vaidade, a glutonaria, a inveja, a avareza, a superstição, a mentira, a idolatria, o adultério, a soberba da vida, e tantas outras coisas degradantes para o ser humano, das quais o Cristão deve fugir como de um dragão diabólico.
Tudo aquilo que afaste o Cristão de seu compromisso com Deus, a saber, operar a própria salvação com "temor e tremor", conforme admoesta-nos o Santo Apóstolo Paulo, é inútil e prejudicial. O Cristão deve viver neste mundo com espírito de permanente compunção, e tudo aquilo que nos afaste dessa salutar compunção deve ser evitado. É por isso mesmo que a Santa Igreja nos faz suplicar em cada Divina Liturgia: "Que nos conceda passar o resto de nossas vidas na paz e no arrependimento, peçamos ao Senhor ..."
"A luz do corpo é o olho. Portanto, se teu olho estiver são, todo teu corpo ficará iluminado; mas se teu olho estiver doente, todo teu corpo ficará em trevas. Pois se a luz que há em ti forem trevas, quão densas serão estas trevas!" (Mateus 6, 22-23)

O JEJUM DOS OUVIDOS

O jejum dos ouvidos consiste em evitar-se a vã curiosidade em ouvir coisas que não  dizem respeito a nós ou não sejam necessárias para o nosso progresso humano e espiritual, e mais ainda, em evitar ouvir tudo aquilo que possa nos desviar do caminho da santificação.
 "Devemos inclinar os ouvidos somente às palavras decorosas; e o ouvido, não cedendo ao desejo de ouvir falar das quedas e debilidades humanas, porá seu gozo em conhecer o bem e a perseverança de cada um, e a graça concedida às criaturas; coisas da quais estando enfermo, se havia desinteressado". (Santo Abade Antonio - o Grande)



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